Diário de bordo: instituição de educação cuida dos estudantes

Fábio Reis
Ana Valéria Reis

Estamos na 12ª Missão Internacional do Semesp e já visitamos duas universidades (Harvard e Southeren New Hampishere University – SNHU) e ainda vamos visitar outras duas instituições. Há aprendizados interessantes até aqui, que gostaríamos de compartilhar.

Em Harvard, ouvimos de Eric Mazur algo com que concordamos: pedagogia é mais importante que tecnologia e é preciso criar um ambiente de aprendizagem em nossas IES.

Mazur apresentou dados e evidências de que é possível haver aulas remotas que engajam e motivam os estudantes. Como isso é possível?: a) com um bom desenho do projeto acadêmico institucional; b) com um bom desenho dos cursos e das aulas; c) com investimento nos professores; d) com motivação dos alunos.

Mazur argumentou que se continuarmos com pouco foco no aprendizado ou se continuarmos com o mesmo processo de avaliação convencional, é provável que nossas IES se distanciem da “vida real”, em que nossos egressos trabalham com projetos reais, resolvem problemas reais de forma coletiva e atuam com pessoas de diferentes perfis. É preciso rever as avaliações individuais, estruturadas em memorização, com pouco foco no aprendizado e nas competências.

A IES com avaliações convencionais pode até obter nota máxima no ENADE, mas isso resolve o processo de aprendizagem, de engajamento, de criatividade e de encantamento dos estudantes? Talvez, não.

Richard Miller, presidente emérito de Olin College trouxe-nos uma perspectiva que ainda não é nossa prioridade: cuidar da saúde mental e do bem-estar dos estudantes. O que nos caracteriza e prevalece é sermos IES de “professor, sala de aula, lousa e giz” ou de zoom com professor falando e tentando instigar a participação, mas com pouco engajamento dos estudantes. Vivência social, saúde, felicidade do estudante não é nossa prioridade.

Esses temas terão que estar em nossa pauta. Cuidar do sucesso do estudante e do seu bem-estar era um diferencial da instituição, agora, é uma necessidade, em tempos de pandemia, de pós isolamento, de necessidade de intensificarmos a convivência social.

A tecnologia é nossa aliada no processo de melhoria do aprendizado e no acompanhamento do bem-estar e monitoramento das vivências e experiências dos estudantes. Justin Reich do MIT, defendeu que antes do investimento em tecnologia precisamos de desenhar bons projetos, investir em pessoas. Para ele, as IES falham quando investem em tecnologia, sem projetos ou querem fazer inovações rápidas apoiadas em tecnologias, não na mudança cultural. Reich, não é contra a tecnologia, mas a entende como um fator de apoio a um processo de transformação institucional. É fato: pessoas, boas ideias, planos e liderança são elementos que podem induzir um processo de transformação institucional.

Por fim, em Harvard, tivemos o professor de MIT, Amitava Babi Mitra, responsável pelo New Engineering Education Transformation (NEED), uma iniciativa transdisciplinar que instiga os estudantes a apreenderem através do desenvolvimento de projetos reais. O NEED não seria uma iniciativa curricular, mas sim um núcleo que congrega alunos de diversos cursos para o aprendizado cooperativo e desenvolvimento de projetos que tenham impacto na sociedade. As IES brasileiras estão avançando nesse tipo de iniciativa, especialmente, através dos projetos integradores e da curricularização da extensão.

A visita a SNHU trouxe perspectivas novas para o grupo. Os gestores declaram que o foco é o estudante, já que os projetos institucionais são pensados a partir do aprendizado e da formação por competências. É comum desenharmos projetos acadêmicos em que declaramos que o estudante é a prioridade, mas não sabemos até onde de fato nos dedicamos a desenvolver e a aplicar ações que tenham o aprendizado como prioridade.

O Reitor da SNHU declara ser um estudioso do tema da aprendizagem. Não é comum isso, pois muitos dos gestores argumentam que pedagogia é um tema para pedagogos e que cabe a eles fazer a gestão executiva. Gestores de diferentes níveis erram quando discutem como o aluno pode se engajar e aprender. Eles acertam quando criticam os discursos vazios e ideológicos do mundo acadêmico. Os gestores não podem esquecer que o “negócio” da instituição de educação é o aprendizado dos estudantes, é pesquisa, é responsabilidade social e que o aluno está na sua IES para aprender algo.

Uma das características da SNHU é sua capacidade de fazer análise de dados, de acompanhar a vida do estudante em diferentes aspectos, em utilizar, de fato, o “big data” como um fator de estratégico. Há equipes que se dedicam em compreender o comportamento do estudante e fazer analises preditivas. No Brasil, precisamos avançar nas análises das informações institucionais, para que possamos acertar mais na tomada de decisões.

A SNHU está refazendo seu modelo acadêmico, com flexibilização dos currículos, com uso correto e contínuo das certificações, com uma formação vinculada ao mercado de trabalho, com aconselhamento dos estudantes. Eles sabem que é preciso reinventar a IES e que o “mais do mesmo” não trará bons resultados, nesse sentido são ousados em imaginar uma IES alinhada com a dinâmica dos tempos em que estamos vivendo.

A SNHU tem 170 mil estudantes, sendo aproximadamente apenas 5 mil presenciais. É uma instituição para estudantes de baixa renda, onde muitos conseguem bolsas de estudos do governo para sua graduação. Somente durante a pandemia eles cresceram 40 mil estudantes.

Com um perfil de público bem definido, um modelo acadêmico de cursos on-line focado no aprendizado do estudante, na flexibilidade e nas competências, a SNHU se tornou referência. Obviamente que a universidade precisa aperfeiçoar processos e projetos, mas hoje, sem dúvida, é uma referência no ensino superior.

Em nossos debates ao longo das visitas conversamos sobre nossas dúvidas, angústias e aprendizados. Sabemos que fazemos um bom trabalho em nossas IES, mas que é preciso avançar, qualificar e intensificar o processo de inovação.

Até o momento, elencamos alguns pontos de aprendizado pessoal:

as mudanças institucionais devem ser inspiradas e conduzidas pelos gestores das IES (esta afirmação é obvia, mas é preciso repetir diversas vezes). Há gestores que desconhecem a dinâmica do ensino superior e há gestores que temem fazer mudanças. Esses gestores farão o mais do mesmo e podem até conseguir os mesmos resultados (duvidamos da manutenção dos mesmos resultados acadêmicos e administrativos, por um longo tempo), mas não vão conduzir mudanças significativas na IES
Se não cuidarmos do aluno, de seu aprendizado e do seu bem-estar, podemos ser rejeitados por eles (baixa matrícula e evasão). Não podemos nos tornar instituições fornecedoras de diplomas, sem valor para a sociedade, em baixa ou alta escala. Temos uma hipótese: IES com conteúdo pasteurizado, sem conexão com a vida real, com professores sem competências digitais e pouco engajados com o aprendizado dos estudantes e com estudantes desmotivados e pouco envolvidos com projetos de vida, com propósitos sociais, terão problemas para manter sua competitividade. Temos um temor: sermos mais iguais do que diferentes, sermos mais executivos e menos conhecedores das estratégias de engajamento dos estudantes.
É preciso desenhar bem nossos projetos acadêmicos e administrativos e dedicarmos tempo para realizar uma mudança cultural na IES. Talvez tenhamos de repensar nosso modelo de negócio, como está fazendo a SNHU. Nossas IES possuem pilares, ritos e tradições que a trouxeram até 2022, mas é preciso entender que pandemia, novas tecnologias, mudanças de comportamento, perfil dos jovens, novas formas de comunicação intensificaram as mudanças na sociedade. Outra afirmação óbvia, mas o que nos trouxe até aqui não nos levará para o futuro. O que ouvimos em Harvard e na SNHU, reafirmaram nossas convicções.

As missões internacionais do Semesp não servem para fazer um “control C e control V”. Elas servem para trazer novos aprendizados, para reafirmamos convicções ou para reaprendermos e refazermos nossas convicções, servem para trocarmos experiências, servem para sermos instigados a repensarmos ações institucionais. Nesse sentido, a missão até o momento cumpre seus objetivos.

Convidamos todas as pessoas que atuam no ensino superior a olharem para o espelho e perguntarem-se constantemente: estou fazendo a coisa certa? Há coisas que preciso repensar ou aprender? Que possamos sempre estar com a mente aberta para as boas novidades e para as boas práticas nacionais e internacionais de nossas IES.

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