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Como definir a agenda para e educação?

Estamos em uma fase de transição política. Quem atua na área de educação, provavelmente, está se perguntando, qual a agenda do governo que assumirá o poder executivo, a partir de janeiro de 2023, na área da educação? O foco do texto não é apontar os temas em discussão, mas apresentar como a agenda pode ser definida. O erro de composição dos grupos de discussão pode gerar visões equivocadas sobre o funcionamento do sistema de educação.

Em entrevista recente para o jornal “O Globo”, Henrique Paim, um dos líderes do grupo de transição, na área da educação, deu pistas sobre a agenda que está por vir: recomposição da aprendizagem dos alunos, perdida durante a pandemia, retoma dos investimentos nas universidades federais, fortalecimento da lei das cotas e avanço da inclusão e diversidade, recomposição das estruturas do MEC e reforço de suas autarquias, como Inep e Capes, entre outros temas. Há outros temas que devem entrar na agenda, por exemplo: alfabetização, formação inicial de professores, aperfeiçoamento do ensino médio.

Os temas apontados são importantes e de fato precisam estar na agenda. Todavia, recomendo que o grupo de transição tenha uma visão estratégica mais ampla e diversificada da educação. A minha hipótese é de que há carência de uma visão sistêmica da área de educação. A ausência efetiva do setor privado na equipe de transição parece não ser a melhor decisão.

Tenho como base para minha afirmação as evidências apontadas em livro publicado em 2014: “Guia de Políticas Públicas: gerenciando o processo”, de Xun Wu, M. Ramesh, Michael Howlett e Sott Fritzen.  O livro é um manual de políticas públicas, que indico para as pessoas que querem compreender como as agendas são elaboradas. Há outras leituras recomendadas, como o artigo de Jeremy Richardson, “New governance or old governance? A policy style perspective”. 

M. Ramesh, um dos autores do “Guia”, defende em suas publicações, um diálogo amplo com os setores representativos da sociedade no processo de construção da agenda de políticas públicas. Estamos vivenciando momentos de incertezas e desconfianças na transição política, o que exige sensibilidade e percepção de que as propostas de políticas públicas deveriam tentar atender os diferentes setores da sociedade. Os consensos podem evitar fragmentações e tensões no âmbito político.

O setor privado representa 76.9% das matrículas na graduação, 84% em cursos de especialização e 31% na pós-graduação stricto sensu. O setor reúne 2.150 IES ou 87.8% do total e 6.2 milhões de alunos. O Semesp é uma das associações representativas do setor privado. Em 2022, publicou a 3º. edição do documento “Diretrizes de Políticas Públicas para o Ensino Superior Brasileiro” com proposta de uma agenda de políticas públicas. O Semesp tem atuado de forma assertiva no debate sobre o tema, inclusive com a elaboração de diferentes pesquisas sobre ensino superior. Há outras associações do setor privado, com projetos e propostas relevantes.

Faço a defesa da participação das associações representativas, no processo de elaboração da agenda de políticas públicas para a educação. O debate, o diálogo e os olhares precisam ser ampliados. Não há uma proposta A ou B que está correta e que precisa ser adotada, embora o agente público tenha que fazer opções e tomar decisões. Os estudiosos de políticas públicas recomendam o conhecimento das múltiplas perspectivas, para que a decisão seja pautada na evidência e na clareza sobre a complexidade do sistema de educação.    

Espero que o novo governo não cometa o erro de construir uma agenda incompleta e que não corresponda a demanda do setor educacional. A resolução de problemas de aprendizagem, de formação de professores, de ampliação do acesso, de atendimento as metas do Plano Nacional de Educação passam pela atuação do setor privado.  

O diálogo ampliado e democrático evitará que tenhamos um sistema de educação organizado no “velho estilo de governança”, em que prevalece a visão de poucos atores e em posturas centralizadas, às vezes ideológicas e focadas na perspectiva daqueles que possuem o poder de decisão.  Isto pode gerar um erro na definição da agenda. O “novo estilo de governança” é utilizado por países que querem ampliar o diálogo e agregar olhares diferenciados. É um estilo mais flexível, dinâmico, participativo e sistêmico, que induz a qualidade.

O objetivo do texto não é criticar a equipe de transição. Estamos iniciando o processo de elaboração da agenda e há propostas em discussão. O objetivo é alertar os responsáveis pela transição de que a agenda de políticas públicas precisa ser elaborada com a participação de atores que atuam na área da educação. Isto é um fator de sucesso, pois constrói consensos e colabora com a melhoria do sistema.

Como professor de História aprendi algo básico, o que deu certo ontem, pode não dar certo hoje ou amanhã.  O momento é de transição e de construção de um projeto, portanto, a melhor atitude seria incluir os setores representativos. Há literatura e evidências sobre os melhores caminhos para se elaborar agendas de políticas públicas. Espero que tenhamos uma agenda representativa e pautada nos princípios do novo estilo de governança.           

Fábio Reis: Pós-Doutorando em Políticas Públicas na Universidade de Coimbra (CEIS 20), Diretor de Inovação e Redes do Semesp, Presidente do Consórcio Sthem Brasil, Secretário Executivo da MataRed Brasil, Colaborador da Faesa na área da inovação acadêmica, membro do Comitê Acadêmico da Cruzeiro do Sul Educacional.