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PARA SOBREVIVER E PROSPERAR

Escrevo a reflexão com base no artigo publicado pelo Inside Higher Education, no dia 6 de janeiro, com o título “From surviving to thriving”.  Os gestores de IES comprometidos com a educação, provavelmente, não querem que suas instituições apenas sobrevivam. Pelo contrário, acredito que eles buscam a prosperidade, que, no sentido amplo, vai além do resultado de um indicador como a Ebitda. Fundamentalmente, prosperar na educação é cumprir seus fundamentos, formar pessoas comprometidas com as demandas da sociedade, gerar conhecimento, despertar a cidadania e o senso ético, entre outras ações.

Minha hipótese é que estamos vivendo uma crise de identidade e de valor do ensino superior. É preciso refletir sobre qual o papel e os desafios das IES, suas funções, organização e dinâmica, sobre como as instituições podem criar canais de diálogo e despertar a paixão pela aprendizagem, pesquisa e atividades de cunho sociais.

Em um contexto de pandemia, de crise financeira e de antagonismos, será que o ensino superior é uma prioridade para as pessoas? Provavelmente, sim. Pesquisas do Semesp demonstram que as pessoas querem ingressar em uma IES. Por outro lado, o postulante ao ingresso no ensino superior deve pensar: Como vou pagar? Como serão as minhas aulas, presenciais, virtuais ou ambas ao mesmo tempo? Terei emprego? Vale a pena ingressas na IES X, Y ou Z, já que não sei o que ela oferece de fato? Quais são os valores da IES? Não adianta a IES prometer o “paraíso” e não entregar. Isso gera desconfiança.

Defendo que retomemos um debate de temas que parecem estar esquecidos. É preciso conversarmos sobre o papel do ensino superior. A educação não pode perder a “guerra” para o individualismo, a falta de empatia, o desprezo pela ciência, um relaxamento dos valores que mantém a sociedade integrada e para uma formação sem sentido. Às vezes me pergunto, não estamos valorizando demasiadamente a “formação para o mercado” e esquecendo de valorizar a formação social, humana, transcendental e profissional? Escrevo essa reflexão, a partir de leituras sobre como a pandemia está provocando revisões sobre a atitude dos gestores em relação aos valores do ensino superior.

Se a IES quer sobreviver, basta manter o mesmo ritmo de funcionamento e, talvez, realizar pequenos arranjos, mas os gestores dessa instituição terão que reconhecer o risco de falecimento por crise financeira ou por inércia. Para prosperar, a IES precisa ter a confiança da sociedade e de seus estudantes. No caso dos alunos, o sentimento de pertencimento e de identidade dos valores são elementos importantes. A confiança tem sua origem no Latim Confidere, que nos remete a concepção de acreditar plenamente, crer e ter fé. Se o estudante confia em uma IES, ele pode “declarar sua fé” e seu compromisso com as propostas educacionais.

Há instituições que construíram seu prestígio em função de um conjunto de atributos acadêmicos e administrativos ou em função de seu forte vínculo com a cidade e região. Mesmos essas instituições não estão isentas de uma autorreflexão contínua sobre a coerência de sua identidade, valores e propósitos, pois correm o risco de entrarem um espiral de crises.

Quais seriam os caminhos para ir além da sobrevivência e prosperar? Se eu tivesse a resposta correta, provavelmente, eu seria um estudioso do ensino superior financeiramente rico. Com base nos autores do artigo que inspirou minha reflexão, Peter Lake e Rob Buelow, aponto algumas atitudes para as IES caminharem para a prosperidade:

  • Tenha os líderes como papel de mordomos: os líderes são os responsáveis pela comunicação, pela difusão da identidade, missão e propósitos institucionais. São eles que precisam dialogar com professores, alunos e sociedade. Cabe aos líderes um papel simbólico de servidor e de referência da IES.
  • Tenha os alunos como agentes da mudança: o protagonismo dos estudantes tem que ir além da sala de aula. Os alunos possuem ideais e querem pertencer a uma comunidade. Provavelmente, cada vez mais não toleram racismo, violência e injustiças sociais, embora tenhamos extremismos antissociais. São eles agentes de mudança. Não pode existir uma educação passiva. Proponha ações que combatam formas de exclusão.
  • Tenha um plano que inspire a geração futura: a geração futura são os jovens que estão ingressando nas IES. Segundo pesquisa da MNI Target Media, 68% dos jovens pesquisados são movidos pelos valores, querem tornar o mundo melhor, possuem consciência social, valorizam marcas socialmente responsáveis. Nossas IES podem padecer pelo choque de gerações (o que o líder quer versus as novas gerações) e pela dificuldade em entender as demandas dos jovens.
  • Tenha plano para o bem-estar, inclusão e proposta acadêmica: Cabe a IES demonstrar que está comprometida com a segurança, saúde, inclusão e bem-estar das pessoas. Não basta a IES ter conceito 5 no MEC, um corpo docente titulado e uma boa infraestrutura. Esses atributos, os concorrentes também podem ter. A IES precisa demonstrar interesse em cuidar do estudante e isto também significa ter uma proposta acadêmica consistente e um currículo que o engaje. É preciso criar valores intangíveis de pertencimento.

Não há um único caminho para a IES ter prosperidade. Sem dúvida, a gestão, o cuidado com a saúde financeira e a inovação estão entre os pilares da prosperidade institucional.

O que apresentei acima não é novidade. Provavelmente, está presente em discursos e ações institucionais. O fato é que, agora, as ações indicadas acima precisam estar em nosso radar. Uma IES não pode ser mantida apenas para sobreviver. Ela precisa prosperar, ter vida e constituir uma comunidade de aprendizagem, no sentido amplo.

*Fábio Reis, diretor de Inovação e Redes do Semesp.

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Redes de cooperação, uma questão de sobrevivência

O Semesp participou da 49ª Conferência Anual da Association for Collaborative Leadership (ACL),  realizada em Albany, New York, entre os dias 18 e 20 de outubro. A ACL é uma associação que, entre outros objetivos, visa apoiar, empoderar ecompartilhar experiencias entre os diferentes consórcios de instituições de ensino superior (IES) dos EUA.

O Semesp é associado da ACL e foi convidado a participar do encontro. A novidade de 2017 foi a apresentação das Redes de Cooperação organizadas pelo Semesp. Apresentamos, através de um Poster, nossa experiência no Brasil. A apresentação gerou boa surpresa, pois em aproximadamente um ano já são seis Redes formadas, em diferentes estágios de implantação, que já acumulam resultados com impactos para  as instituições participantes.

Tais impactos são explicados pela cooperação efetiva entre as IES, que só se tornou possível graças à confiança adquirida entre as pessoas que participam das Redes. Aliás, a confiança é uma palavra chave em processos de colaboração e explica o sucesso dos diferentes consórcios ou redes que são associados à ACL. 

Após cada debate a conclusão era que a redes criam sinergias, geram economia, adquirem escala, ganham força, e nossa crença é de que é preciso organizar mais e mais Redes de Cooperação no Brasil. Essa tem sido uma das funções do Semesp: colaborar com a sustentabilidade e com o sucesso de seus associados.

Durante as apresentações ocorridas no encontro da ACL, um tema recorrente que causou bons debates foi exatamente a construção de confiança. Aliás, cabe frisar, a confiança nas redes não é entre instituições, mas sim entre pessoas. Seria possível então as instituições de ensino superior (ou mesmo as associações representativas do ensino superior) cooperem sem que exista confiança entre seus participantes? A nossa resposta é: não. A confiança é conquistada, e isso é um processo. Requer esforços, encontros, tolerância. Assim, a confiança ocorre quando há bons propósitos entre as  pessoas das diferentes instituições envolvidas. Em Albany, conversamos sobre ética e compromisso de compartilhar projetos, custos e estratégias, e sobre as funções da ACL.

Aliás, por que existe uma associação para fomentar a cooperação no ensino superior? Nossa resposta: para integrar instituições que efetivamente querem ter relevância e impacto na sociedade. A cooperação é entendida como um dos caminhos para a melhoria dos processos acadêmicos e administrativos. As IES que participam da ACL declararam não apenas o propósito, mas mostraram resultados, metricamente auferidos, de economia financeira, de melhoria da sustentabilidade institucional e aumento na qualidade dos serviços oferecidos aos estudantes e à sociedade. Nesse sentido, há uma evidente convergência com a proposta das Redes de Cooperação do Semesp.

O Semesp acredita na formação de Redes, e as estimula, como uma importante estratégia de estabelecer conexão, compartilhar experiências bem e mal sucedidas, fazer benchmaking e, por que não?, trazer alguns questionamentos. Como, por exemplo: será que ainda acreditamos que uma IES conseguirá ser competitiva ao manter-se isolada e continuar fazendo as mesmas coisas que sempre fez, para preservar a “tradição”?

A Conferência iniciou-se com uma conversa entre reitores de três IES norte-americanas. Houve convergência entre dirigentes: os consórios ou redes qualificam os processos acadêmicos e administrativos da instituição. Para os reitores, manter-se isolado é optar pelo enfrentamento de uma série de desafios que podem “custar” o sucesso e, portanto, o futuro da instituição. A opção é clara: as redes agregam valor. 

Fica claro que o sucesso de uma rede está diretamente relacionado à capacidade de gestão e liderança. Não é apenas o reitor ou os dirigentes máximos que devem cuidar da dinâmica das redes. As responsabilidades devem ser compartilhadas entre as pessoas nomeadas e reconhecidas pela instituição, como responsáveis e líderes das redes.  Outro fator de sucesso é a capacidade de a rede estabelecer um plano estratégico de atuação, acompanhado em sua execução com o devido folow up, que é a verificação dos resultados via métricas predefinidas.

Durante a Conferência da ACL, retomamos a discussão sobre a trilha que cada Rede de Cooperação do Semesp deve seguir para obter sucesso.

Nossa sugestão é:

·         Saiba por que participar da Rede. Participe com convicção e compromisso. Uma Rede de Cooperação não é uma ação entre amigos, mas de pessoas engajadas que se propõem a colaborar umas com as outras com instinto de auto preservação.

·         Organize a gestão da Rede e tenha uma liderança para “fazer as coisas acontecerem”, lembrando que, certas vezes, liderança não está necessariamente associada ao cargo.

·         Estabeleça um plano com objetivos bem definidos e com métricas claras e predefinidas.

·         Avance no processo de cooperação, compartilhamento e redução de custos, sempre respeitando o ritmo de cada IES e das pessoas envolvidas para o sucesso da Rede.

·         Comunique os bons resultados na instituição e na sociedade, e lembre-se de que comunicar não é apenas informar, mas compartilhar e relacionar-se.

·         Compartilhe as experiências vividas, tantas as exitosas quanto as mal sucedidas, pois é isso que manterá a Rede viva e dinâmica.

·         Fortaleça a relação de confiança entre todas as pessoas envolvidas na Rede de Cooperação.  Promova o encontro entre pessoas: o convívio leva à confiança.

O Semesp que ser uma referência em organização de Redes de Cooperação e interagir e apoiar outras redes existentes ou em formação no Brasil e no mundo. O diálogo entre diferentes iniciativas é necessário. A experiência internacional demonstra isso.

Ao organizar as Redes de Cooperação, o Semesp quer colaborar com o sucesso de seus associados e contribuir de forma efetiva para melhorar e fortalecer o sistema de ensino superior do Brasil.

Participar da ACL é uma grande oportunidade, pois permite networking com diferentes pessoas, conhecer iniciativas e ter aprendizado institucional. Nosso objetivo é avançar sempre, e ao mesmo tempo respeitar as identidades e os ritmos institucionais. Com a participação na Conferência da ACL, o projeto do Semesp ganha projeção internacional. Mas, muito mais que isso, ganha experiência, aprendizado e parceria com outras redes.

Referindo-se à participação do Semesp na ACL, nosso Diretor Executivo, Rodrigo Capelato, afirmou: “Isso é um trabalho incrível, que vai possibilitar um salto para as IES participantes. E é só o começo. Espero um dia ver a ideia disseminada como cultura no nosso setor, assim como já é, há muitos anos, nas universidades americanas”. 

Esse é o nosso desejo, e de todas as pessoas que estão envolvidas com as Redes de Cooperação do Semesp, que acreditamos serão um importante fator de sobrevivência e fortalecimento de nossas IES.

Fábio Reis é  Diretor de Inovação e Redes

de Cooperação do Semesp e Professor do Unisal

João Otávio B. Junqueira é Diretor de Relações

Institucionais do Semesp e Reitor do Unifeob.


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Mudanças significativas no ensino superior: quem viver, verá.

Fábio José Garcia dos Reis

As organizações erram quando não percebem que há mudanças significativas nos ambientes em que atuam. A História nos ensina que as organizações que mais rápido se adaptam às novas realidades econômicas, sociais, culturais, tecnológicas e de concorrência obtiveram sucesso.

As instituições de ensino superior (IES) são organizações acadêmicas que, ao longo do tempo, demonstram resistências às mudanças, em função da fragilidade das lideranças, da postura conservadora perante as novas realidades, do corporativismo acadêmico e da permanência de concepções de “universidade” elaboradas no século XIX e início do XX. É que preciso repensar essa concepção e atualizá-la, em função da dinâmica do século XXI.

Há anos leio, visito IES no Brasil e em diversos lugares no mundo e converso com pessoas que se dedicam a pesquisar o ensino superior. Fui instigado a escrever esse texto, após algumas leituras interessantes. Eu gostaria de sugerir a leitura de livros de diferentes autores (inclusive de correntes de pensamento divergentes). Recomendo a leitura de “Universidade em ruínas na república dos professores”, organizado por Hélgio Trindade; “Dinossauros, gazelas e tigres”, organizado por Victor Meyer e J. Patrick; “A aventura na universidade”, de Cristovam Buarque, “A universidade inovadora: mudando o DNA do ensino superior de fora para dentro”, de Clayton Christensen e Henry Eyring; “Ensino híbrido”, organizado Lilian Bacich, Adolfo Neto e Fernando Trevisani; “Los nuevos modelos universitários en América Latina”, de Claudio Rama, “Guiar el Mercado”; organizado por José Joaquin Brunner, “Sustaining change in Universities”, de Burton Clark; “Change.edu, rebooting for the new talent economy” de Andrew S. Rosen; “The end of college: creating the future of learning and the university of everywhere”, de Kevin Carey e “Organizações sustentáveis na educação superior”, organizado por Fábio Reis. São livros que discutem as mudanças e as novas dinâmicas no ensino superior e apresentam cases de IES que realizaram mudanças significativas.

Farei comentários sobre alguns artigos dos últimos três livros indicados. Maurício Garcia escreveu um capítulo no livro sobre organizações sustentáveis, lançado em setembro de 2015. O título é “Estamos na terceira onda do ensino superior?”. Garcia fez algumas afirmações em que ele previa que “o grande ativo das instituições no futuro não será seu material didático, nem seu corpo docente. Será sua capacidade de ter uma comunidade virtual engajada” (…) “o que os grandes providers de conteúdo virtual do mercado vão fazer? Hoje, quando discutimos educação, falamos sobre instituições de ensino superior. Mas… e quem não é uma instituição? O que pode significar se o Google quiser entrar no mercado de educação? Ou a Apple? Ou a Amazon? Ou seja, se, em vez de serem providers, eles quiserem ser players?”.

Ao abrir o meu e-mail, no último final de semana de janeiro de 2016, deparo-me com uma mensagem (enviada para algumas pessoas) de Maurício Garcia com o título “How Amazon could destroy college as we know it?” (clique aqui para visualizar). Garcia enviou um link com um artigo publicado por Alexander Holt, em que o fundador e CEO da Amazon, Jeffrey Bezos prevê que “ the future of Amazon University is Strong as we continue to become the first truly global university. As our alumni network and reputation with customers and employers grow, we predict increasing demand for our services. We are excited about the future of a more educated, less indebted citizenry”. Bezos projeta uma Universidade global que tenha como princípios acesso, qualidade, baixo custo e tecnologia.

A capacidade de inovação e de soluções tecnológica de empresas como Amazon, Apple e Google é muito superior a das nossas IES. Garcia termina o capítulo afirmando que “tudo indica que ainda teremos grandes mudanças pela frente, mas é difícil prever” (set/2015). O e-mail (jan./2016) termina com a seguinte frase “quem viver, verá”. Caro leitor, o que você pensa sobre as questões colocadas por Garcia? Quais seriam as estratégias diante dessa nova realidade? Hoje, estamos preocupados com financiamento, com a concorrência e com a atuação dos grandes grupos educacionais. Caro leitor, além de todas essas preocupações, você já projetou a sua IES para 2020 e já começou o desenho para 2030?

Eu ganhei o livro “Change.edu”, de Antonio Carbonari. Quem atua no ensino superior sabe que ele é um dos empreendedores do setor. Carbonari fez a seguinte afirmação, quando me entregou o livro: “Fábio, sei que você estuda tendências educacionais, aqui está um livro sobre o futuro do ensino superior”. No ultimo capítulo, “The learning playbook: 2036 and coming twenty-five years of change in higher education”, Andrew Rosen aponta sete tendências:

  1. os sistemas educacionais serão mais Mobile e os avanços tecnológicos vão permitir que as diversas formas de ensino online tornem-se superiores ao do ensino unicamente face to face, em número de matriculados e em qualidade. Os nichos face to face vão permanecer;
  2. o ensino será mais desagregado ou fragmentado, pois os estudantes vão querer vivenciar diversas experiências de aprendizado, via cursos abertos e cursos específicos, por exemplo. Os estudantes vão optar por escolas flexíveis em seu modelo curricular;
  3. o ensino será mais personalizado, pois os estudantes vão fazer opções de trajetória, na formação escolar. Eles irão para a escola e terão a oportunidade de construir a sua carreira de graduação, a partir de diferentes possibilidades temáticas. O professor será um coach, um mentor que orienta o aprendizado, uma pessoa que ajudará os estudantes a elaborarem seus projetos e seus objetivos de aprendizado;
  4. haverá um foco maior na avaliação da aprendizagem. Haverá mais preocupação com o engajamento dos estudantes, com a eficiência do aprendizado e com as estratégias que possibilitam os estudantes aprenderem. O crucial será tornar o aprendizado algo significativo;
  5. a educação será mais acessível, o que permitirá pessoas de diferentes culturas e lugares do mundo terem acesso a ofertas educacionais com custo menor e com qualidade reconhecida pelos agentes reguladores e pela sociedade;
  6. o ensino será mais global, em função do avanço do ensino virtual, das redes de cooperação, das facilidades de deslocamento das pessoas e da própria presença de novos players nos sistemas educacionais;
  7. o ensino será mais agradável e interessante, o que favorecerá o engajamento dos estudantes. Dispositivos eletrônicos, diversidade de aplicativos, games, aprendizagem ativa em ambientes virtuais, entre outros processos facilitados pela tecnologia tornarão a educação menos burocrática, repetitiva e desmotivadora.

Em “The end of College”, Kevin Carey, ao escrever sobre a universidade de qualquer lugar, acredita que o ensino superior move rapidamente para o modelo híbrido, em que os estudantes não deixarão de ir para as IES em alguns dias durante a semana ou mês. Os recursos educacionais estarão disponíveis em ambientes virtuais, de forma ampla. Carey acredita que as IES vão manter links de cooperação para viabilizar a troca de recursos acadêmicos que colaboram com o aprendizado dos estudantes. A ideia de admissão será anacrônica, pois o ensino superior será aberto e acessível. As IES estarão abertas para qualquer pessoa, de qualquer lugar. Ele cita os exemplos de MIT e Harvard, que disponibilizam cursos e recursos educacionais gratuitamente.

Kevin acredita que as IES vão oferecer diversos tipos de cursos de formação e em função da flexibilidade e da mudança do conceito de currículo, os estudantes poderão compor sua formação de graduação, em diferentes instituições. Os ambientes de aprendizagem serão sofisticados e personalizados, portanto, as informações sobre a vida acadêmica do estudante, sobre suas dificuldades de aprendizado e sobre suas experiências pedagógicas na instituição serão acompanhadas por plataformas de aprendizagem com alta capacidade de gerar informações sobre a vida acadêmica dos estudantes.

As pessoas tendem a manterem-se matriculadas em uma ou mais instituição ao longo da vida, pois haverá uma percepção de que será necessário aprender a aprender continuamente. As IES deverão tornarem-se especialistas em relações entre as pessoas e terão que facilitar e instigar o relacionamento das pessoas. A diversidade terá que ser respeitada.

Os ambientes de aprendizagem vão mudar de forma significativa. A “Universidade de qualquer lugar” terá centros de ensino e aprendizagem interdisciplinar, em que as pessoas vão engajar-se em projetos significativos e criar redes de cooperação e aprendizado coletivo. Nesse contexto, o papel do professor irá mudar radicalmente, da mesma forma, a tecnologia vai impactar de forma significativa a forma como nós conhecemos o ensino superior hoje.

Caro leitor, procurei juntar todas as reflexões propostas pelos autores dos livros que apresentei e fiz um breve panorama. Eu não tenho dúvida de que haverá mudanças significativas no ambiente do ensino superior, que vão além da aprendizagem e das metodologias ativas.

As IES que não conseguirem perceber as novas realidades tornar-se-ão obsoletas e perderão sua competitividade. Cabe aos líderes institucionais serem os agentes da mudança organizacional, para que a IES possa realizar as transformações que a tornem contemporânea e alinhada com as dinâmicas do século XXI, sem cair na armadilha dos modismos e da perda de sua identidade e de seu papel social. Ele apresenta de forma transparente as perspectivas institucionais.

Os bons líderes de IES possuem a capacidade de se manterem atentos aos resultados financeiros e acadêmicos do presente sem deixarem de estar sintonizados com o que há de relevante no ensino superior. Nós, líderes e estudiosos do ensino superior, precisamos estar atentos ao que estar por vir. Se a previsões de mudanças citadas acima se concretizarem, teremos um ambiente de ensino superior bem diferente do que temos hoje. Como escreveu Garcia, “quem viver, verá”.

PS: Maurício Garcia é Vice-Presidente Acadêmico da DeVry Brasil e uma pessoa engajada no debate sobre a dinâmica do ensino superior do Brasil.

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Crise, liderança e inovação

Por Fábio Garcia Reis

Ronaldo Mota, Reitor da Universidade Estácio, publicou no dia 23/12/2015 um artigo no jornal “O Hoje”, de Goiás, com título “Temos uma crise, ou seja, há oportunidades educacionais”. Ele argumenta que na educação superior não podemos fazer sempre o mesmo, por isso, é preciso perceber as “mudanças profundas” que acontecem para “entendê-las e usá-las estrategicamente”. Mota cita Albert Einstein, ao fazer referência aos momentos de crise como propulsores da angústia, das invenções, das inovações e das estratégias. Assim que li o artigo de Mota, comecei a ler o livro “Engines of Innovation: the entrepreneurial university in the twenty-first century”, de Holden Thorp e Buck Goldstein.

Farei uma interpretação das propostas dos autores do livro, com o objetivo de provocar os líderes das IES. Eu concordo com Ronaldo Mota. A crise traz oportunidades, da mesma forma, entendo que a inovação colabora com a superação da crise. Inovação é entendida aqui como uma forma de melhoria dos processos acadêmicos, com base nas melhores referências do ensino superior, no que diz respeito ao processo de aprendizagem, ao perfil dos professores, à interdisciplinaridade, à definição de estratégias e métricas, ao fomento da cultura empreendedora na dinâmica das IES e à capacidade da instituição em resolver problemas de interesse da sociedade. A inovação não é necessariamente a invenção de algo novo. Ela pode ser a melhoria de processos aliada à alta capacidade de gestão dos líderes. Os líderes de uma IES estão representados, especialmente, pelo reitor e pró-reitores, além dos diretores e coordenadores.
Os autores do livro entrevistaram vários reitores de universidades, que são os principais responsáveis pela superação da crise e pelo incentivo à inovação. Um líder (reitor) é capaz de conduzir as mudanças institucionais em tempos de crise, quando ele é o agente que expressa em sua atitude, a missão, os valores e as estratégias da instituição, elaboradas de forma coletiva. O líder é a referência da cultura institucional e da gestão da mudança em tempos de crise. Ele deve ser o guardião da transparência dos projetos institucionais e da coerência entre discurso e atitude.

O clima organizacional de uma IES pode refletir a personalidade da liderança. Um líder coerente e eficaz formam bons times, ajuda as pessoas a desenvolverem seu potencial, inspira, dialoga, conecta e valoriza as pessoas, foca nas estratégias e nas metas institucionais, conhece a dinâmica da instituição, toma a decisão baseada em análise e maneja crises.

Cortar custos, ter uma atitude prudente, ser capaz de adiantar-se à crise, focar em ações que garantam o funcionamento da IES são posturas convencionais, responsáveis e necessárias de um líder que conhece gestão. Há diferenças entre o líder que se limita a ter uma atitude convencional e aquele que, além da atitude convencional, possui uma mentalidade empreendedora e inovadora. É isso que os autores do livro escrevem, quando defendem que a inovação é a alternativa para superar a crise.

Uma gestão obscura e tendenciosa é representada por líderes (todos que possuem função de gestão) que não possuem habilidades para exercerem essa função, por incapacidade técnica ou por atitudes antiéticas. O Brasil vive uma crise de liderança. Estamos em um momento em que desconfiamos de nossas instituições públicas e privadas. É inconcebível uma IES que assume em seu Projeto Institucional a ética, a justiça, o diálogo, entre outros valores de respeito às pessoas, permitir que líderes incoerentes mantenham-se em suas funções. As IES são instituições de educação e formação de cidadãos, portanto, não podem tolerar a hipocrisia. Errar na escolha dos líderes ou manter líderes inadequados gera conflitos que desgastam o clima organizacional e causam danos à dinâmica da instituição. Líderes que compreendem a dinâmica do ensino superior conhecem o perfil ideal de professor e de estudantes e o significado da inovação, via aprendizagem ativa ou tecnologia, por exemplo.

Torp e Goldstein entendem que os estudantes são o coração de uma IES e defendem novas abordagens no processo de ensino e aprendizagem, novos arranjos curriculares e foco na interdisciplinaridade, para atender a geração de alunos que ingressa no ensino superior.

Para eles, a mudança do perfil dos estudantes, a exigência de habilidades por parte do empregador (que o aluno não é instigado a desenvolver de forma adequada), o fácil acesso à informação, as redes sociais, os novos tipos de atividade profissional e as exigências da sociedade são indicadores que demonstram que os modelos convencionais de organização da IES não correspondem ao que sociedade exige, no século XXI. A IES e o diploma do ensino superior podem tornar-se irrelevantes nas próximas décadas, se o modelo de organização, de ensino e de aprendizagem não mudar.

Uma instituição de ensino não pode continuar a ser organizada de forma compartimentada. Em nossas IES ainda há setores que não se comunicam, pessoas que não conversam, hierarquias desnecessárias, estratégias que não são convergentes, intrigas esquizofrênicas. Como uma IES pode superar a crise e ser inovadora se permanece fragmentada e sem visão sistêmica?

Acredito que ainda há “donos do poder” que olham muito mais a estrutura do que a cultura institucional. Uma IES com este perfil não se torna contemporânea. Torp e Goldstein defendem que o “molho secreto” de uma IES está na capacidade do líder juntar os talentos para criar sinergias, em prol de um projeto acadêmico atualizado. As IES competitivas e com menor probabilidade de serem atingidas pela crise superaram a fragmentação e focaram em estratégias que instigam novos modelos acadêmicos.

Um dos modelos acadêmicos apresentados pelos autores é o da interdisciplinaridade. Eles argumentam que o mundo real não é compatível com o modelo de currículo e de ensino em que as disciplinas estão fragmentadas e os professores não dialogam. Os problemas reais da sociedade exigem soluções complexas. Dificilmente uma disciplina ou área do conhecimento conseguirá apresentar soluções, se não recorrer a áreas correlatas.
De modo geral, em nossas IES, os currículos são estruturados por disciplinas que, geralmente, não possuem conexão e a interdisciplinaridade é muito mais um conceito e um desejo do que uma realidade. Os líderes contemporâneos fomentam a integração das disciplinas, instigam os professores a dialogarem e investem em laboratórios e centros de pesquisas interdisciplinares.

Obviamente, a cultura interdisciplinar não é algo fácil de ser estabelecida, pois requer diálogo, tempo para ganhar maturidade e conhecimento do seu significado. Uma IES que prioriza a interdisciplinaridade torna o seu projeto acadêmico mais perceptível e integrado com os problemas reais, pois o projeto deve ser acompanhado de um modelo de ensino hands on. O estudante percebe que a formação interdisciplinar é significativa, já que o processo de aprendizagem requer protagonismo do aluno e vínculo com a sociedade. Investir na cultura interdisciplinar e no modelo de ensino hands on não requer investimentos de recursos financeiros significativos e pode ser uma oportunidade de inovação.

Instituições que possuem estratégias de ensino prático tendem a criar serviços e produtos, portando, a se aproximarem do setor produtivo. É bem-vinda a prestação de serviços e a geração de negócios que possam diversificar a entrada de recursos financeiros no orçamento de uma IES.

As organizações não superam eventuais crises quando estão inertes ou quando não possuem planos adequados, com metas plausíveis. Ser uma IES inovadora e empreendedora exige gestão profissional, tempo para a mudança e recursos humanos e financeiros. Não adianta uma IES sonhar em ser inovadora, sem ter consistência do plano de inovação e liderança capaz de conduzir a mudança. Uma IES competitiva antecipa-se ao futuro, sem deixar de agir no presente.
Superar crises, olhar as oportunidades e fomentar a inovação e o empreendedorismo são ações que requerem liderança inspiradora, pessoas comprometidas, conhecimento dos melhores parâmetros do ensino superior, network, planejamento e capacidade de transformar o sonho em realidade.

Estamos em tempos de crise. Cabe aos líderes terem prudência e sabedoria para cortar gastos, mas acima de tudo, terem mentalidade empreendedora.

Espero que os líderes saibam conduzir suas instituições e apresentem soluções que surpreendam a sociedade, que agreguem valor à marca, que gerem recursos e que tornem a IES, referência de qualidade.