Estamos em crise, mas há soluções

Está complexo fazer a gestão de uma IES? Sim, sem dúvida, e tenho a sensação de que a complexidade tende a se intensificar. Por que isso pode ocorrer? Aponto algumas possíveis respostas: a) a crise da carência das matrículas, especialmente nos cursos presenciais e, por outro lado, a concentração das matrículas do EAD, em poucas mantenedoras; b) a crise de valor do ensino superior e o avanço dos concorrentes que ofertam diferentes certificações e formação que não estão vinculadas às IES; c) a crise dos modelos acadêmicos convencionais, que não engajam, não priorizam a aprendizagem e não criam conexões com a sociedade, em especial com o setor produtivo; d) a crise das estratégias, para que o estudante tenha sucesso na IES e se mantenha matriculado; e) a crise gerada pela deficiência de gestão, pelo pouco conhecimento do ambiente do ensino superior, pelo desconhecimento das tecnologias emergentes, pelo pouco foco na economia digital.

Vou tentar em cinco parágrafos, comentar as crises indicadas acima. Vamos à primeira crise – a diminuição das matrículas é evidente e a sensação é de que faltará estudante em nossas IES. Por outro lado, as matrículas no EAD aumentaram, segundo o último censo, todavia, elas não aumentaram na população entre 18 e 24 anos. Segundo dados do Semesp, há 40,9 milhões de pessoas com ensino médio, mas que não estão matriculadas em nossas IES. Menos jovens no ensino superior, infraestrutura ociosa (salas de aulas vazias), inflação em alta, pressão dos fornecedores de produtos educacionais para aumentar o preço, programas públicos de financiamento estudantil precários são alguns de nossos problemas. A crise das matrículas no ensino superior tente a aumentar, salvo em IES que atuam em nichos e naquelas que estão sintonizadas com o mundo que estamos vi https://www.semesp.org.br/fnesp/programacao vendo.

Segunda crise – os diplomas podem perder o valor e o seu glamour, embora o ensino superior comprovadamente aumente a renda e gere mais emprego. Fazer uma “faculdade” requer recursos financeiros, disponibilidade de tempo e perspectiva de que o diploma irá trazer benefícios. Os recursos financeiros são consumidos pelas despesas pessoais e pela inflação, o tempo para estudar é escasso para alunos trabalhadores e a desconexão entre IES e o mundo do trabalho pode aumentar, já que nossas IES, de modo geral, não formam pessoas tenham as competências necessárias para uma sociedade que requer comunicação, criatividade, capacidade de se relacionar em ambientes de diversidade, de resolver problemas complexos e de uso das tecnologias digitais. Por outro lado, aumenta o número de novos fornecedores de educação que oferecem uma formação com um tempo menor, mais flexível, menos custosa e que estão sintonizados com a economia digital. Não basta ter um diploma, pois esse documento precisa trazer conhecimento e diferentes valores agregados. Corremos o risco de ter pessoas com diplomas de um curso, que vão ocupar funções com menores salários, e pessoas, com diplomas no mesmo curso, mas com formação com alto valor agregado. A desigualdade social pode ser mantida ou se intensificar.

Terceira crise – modelos acadêmicos são responsáveis pelo nível de engajamento e aprendizado dos estudantes. Quando eles não estimulam a resolução de problemas reais e a personalização do aprendizado são demasiadamente disciplinares, pouco flexíveis, estruturados por avaliações que cobram repetições e memorizações, distantes de uma formação baseada em competências, a IES provavelmente gera o descontentamento dos estudantes jovens, pouco engajamento e evasão. Modelos acadêmicos são responsáveis pelo coração da IES, pois indicam o propósito, as concepções de aprendizado e a forma como a instituição concebe seu currículo.  

Quarta crise – é preciso ter um olhar holístico sobre os estudantes, cuidar do seu bem-estar, da sua experiência social e universitária, da sua formação humana, cidadã e profissional e da forma como nos relacionamos e respondemos às suas demandas acadêmicas e administrativas. Não é usual realizarmos análises sobre a trajetória dos estudantes nas diferentes atividades em que ele está inserido, durante toda a sua formação na IES. É comum organizarmos estruturas de atendimentos ao estudante, mas continuarmos sendo lentos nas respostas. Buscamos formas administrativas e processuais para combater a evasão, mas pouco oferecemos tutorias e orientações para que ele tenha uma convivência social saudável e um aprendizado significativo. Sucesso do estudante é muito mais que empregabilidade.

Quinta crise – é preciso se dedicar mais ao estudo do ambiente do ensino superior, é preciso fazer benchmarketing e buscar boas referências de IES inovadoras. É preciso ser um bom gestor, mas acima de tudo, um líder e uma pessoa que inspira as mudanças. IES isoladas, que não possuem conexões tendem a fazer mudanças pautadas em poucas experiências e vivências, por isso, o risco do erro é maior. Geramos crises institucionais por fazermos o mais do mesmo, em um contexto dinâmico. Erramos quando somos demasiadamente resistentes às mudanças. Nem tudo que é externo é melhor, todavi, é preciso dialogar, cooperar, atuar em rede e compartilhar ideias. Geramos crises pelo nosso conservadorismo exagerado. Uma IES pode ter obtido sucesso durante 30 anos, mas o sucesso dos próximos 30 anos não está garantido.

O leitor pode ter outras crises em sua perspectiva e experiência, todavia, acredito que seja consenso de que estamos em tempos incertos e difíceis para o gestor que toma as decisões. Não navegamos em um oceano azul, pelo contrário, a turbulência indica falta de estudantes para o ensino superior.

O nosso sistema de ensino superior não é sustentável com crises, com modelos acadêmicos desconexos com a dinâmica da sociedade, com políticas e estratégias mais orientadas ao mercado do que a educação, com líderes fechados em seu mundo, com temor em assumir risco, com burocracia do MEC e com desconhecimento das tendências do ensino superior. Há soluções para contornarmos as crises. Aponto alguns caminhos: a) atue em rede e esteja aberto ao aprendizado; b) tenha um modelo acadêmico relevante; c) priorize o aprendizado do estudante; d) tenha um projeto para o sucesso do estudante; e) busque compreender a dinâmica do ensino superior; f) mantenha conexões com o setor produtivo e responda aos desafios das ODS; g) cuide, valorize e inspire as pessoas. Simples, não é? Quais são as suas soluções, caro leitor? Também precisamos de políticas públicas consistentes, duradouras e que desburocratizem o sistema de ensino superior.              

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