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CONIC-semesp, um estímulo bem sucedido à formação de pesquisadores

Em 1985, quando eu estava no primeiro ano do curso de licenciatura de História, meu professor Francisco Sodero, da disciplina de “Introdução à História”, sempre falava da importância da iniciação científica. Ele pediu um trabalho individual: todos os alunos deveriam buscar um documento, preferencialmente do século 19 ou início do século 20, e fazer uma síntese. Como sou de Aparecida, investiguei com meus parentes, consegui um jornal do final do século 19, “Luz da Aparecida”, e fiz a síntese com base em um texto do Cônego Antonio Marques Henriques, um sacerdote português político e republicano.

No segundo ano do curso, participei do meu primeiro Congresso de História e fiz uma comunicação oral desse trabalho iniciado no ano anterior. Já no terceiro ano o trabalho ganhou mais consistência e, com base nele, venci um prêmio estadual. Posteriormente fiz meu mestrado e doutorado, e a base das minhas pesquisas foi o mesmo jornal.  A vida e a trajetória política e religiosa do Cônego Henriques me acompanharam durante 11 anos.

Quando iniciei o curso de História eu trabalhava, como quase todos os estudantes matriculados no ensino superior noturno.  Eu entregava contas de água do Serviço de Águas e Esgoto de Aparecida (SAAE) nos diversos bairros da cidade. Foi uma época incrível, em que conheci muita gente com quem até hoje mantenho contato.

Não tenho dúvida em afirmar que a iniciação científica no curso de História transformou a minha vida. O incentivo dos professores foi fundamental, assim como o apoio da então Faculdade Salesiana (hoje UNISAL). Até hoje, no UNISAL, eu percebo o brilho nos olhos dos estudantes quando eles desenvolvem bons trabalhos de iniciação científica. Porque não são todos que se interessam e que fazem um bom trabalho. Eu fui diretor do UNISAL por mais de 10 anos e sei muito bem o impacto positivo na vida dos alunos, quando eles recebem apoio da instituição para desenvolverem trabalhos de iniciação científica.

O investimento em pesquisa requer recursos financeiros e em pessoas. Não são todas as instituições de ensino superior que possuem perfil ou vocação para a pesquisa, assim como nem todas as IES conseguem manter investimentos consideráveis nessa área. Todavia, é perfeitamente possível manter programas de iniciação científica.  

Gestores e professores de IES que motivam os estudantes a se engajar em diferentes projetos, e que os instigam a realizar pesquisas de iniciação científica, reconhecem que o aprendizado é maior e que o compromisso deles com os projetos das IES é significativo, pois essa prática constrói um sentimento de pertencimento do estudante em relação à instituição.

O Semesp realizou nos dias 24 e 25 de novembro o 17º. Congresso de Iniciação Científica (CONIC-Semesp), no Centro Universitário UNiÍTALO, em São Paulo. Muitos podem se perguntar: por que o Semesp, uma associação que congrega mantenedores de IES, realiza um evento para os estudantes? A resposta é relativamente simples.

Em primeiro lugar, porque o desenvolvimento do Brasil passa pelo investimento na iniciação científica. Iniciativas como o PIBID, financiado pela CAPES, entre outras que fomentam a pesquisa dos estudantes, precisam ser intensificadas no Brasil. Há várias IES que realizam eventos de iniciação científica, e eventos com esse perfil precisam ser ampliados e incorporados em outras IES. Através do CONIC-Semesp, o Semesp atua para melhorar a qualidade da educação, para incentivar a pesquisa e para melhorar o aprendizado.

O Semesp acredita e investe nos jovens que desenvolvem projetos de iniciação científica, porque esses jovens podem desenvolver ou descobrir habilidades que não percebiam até então e, através do CONIC podemos incentivar a formação de futuros pesquisadores.   

Estudantes que realizam pesquisa de iniciação científica estão engajados com o aprendizado e compromissados com os projetos institucionais. Além disso, os trabalhos apresentam uma série de soluções de impacto na sociedade, já que são de diferentes áreas do conhecimento. Através da iniciação científica, os alunos transformam suas ideias em pesquisa, em algo que no futuro pode se transformar em um serviço, um produto ou em uma referência para as pessoas compreenderem os fenômenos sociais. No meu caso, relatado no início deste texto, estudei o fenômeno religioso e suas relações com as políticas de governo.

Estudos mostram que estudantes que se dedicam ao estudo e à pesquisa, que escrevem bons textos e sínteses e que desenvolvem a habilidade de comunicação possuem maior capacidade de empregabilidade e de exercerem a cidadania de forma plena. O CONIC-Semesp é um Congresso que incentiva essas habilidades, que melhora o aprendizado dos estudantes, que possibilita aos estudantes transformarem suas ideais em projetos que podem ter impacto na sociedade.

É nessa perspectiva que o Semesp realiza o CONIC-Semesp. Em 2017, foram mais de 2.400 projetos inscritos e foram aprovados 2.099 trabalhos para serem apresentados. Circularam durante os dois dias de evento, mais de 4 mil pessoas. Acompanhar as apresentações, conversar com os estudantes, sentir o brilho nos olhos deles, a felicidade das famílias, o apoio dos amigos e perceber o apoio das IES é algo que todos os gestores de IES e professores deveriam vivenciar, quer no CONIC-Semesp, quer na instituição a que está vinculado. Nesse sentido, faço o convite para que os gestores de IES criem programas de iniciação científica em suas instituições e incentivem a participação de seus estudantes no CONIC-Semesp, um evento que representa um bem sucedido estímulo à sua formação como futuros pesquisadores. 

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Caminhos para construirmos um novo paradigma de IES. O case na Arizona State University.

As boas leituras são sempre instigantes. Recomendamos ler o livro “Designing the New American University”, escrito por Michael Crow e Willliam B. Dabaras, que motivou nossa visita, e apresenta as inovações realizadas na Arizona State University (ASU), onde Crow é presidente.

A ASU possui aproximadamente 84 mil estudantes, estando 19 mil no ensino a distância. A revista U. S. News, focada em rankings na área de ensino superior, publicou em 2015, um ranking das IES mais inovadoras na área de currículo, uso da tecnologia para educação, perfil de professores e engajamento dos estudantes. A ASU está em primeiro lugar,  Stanford University,  em segundo, e MIT, em terceiro.

Nós vistamos a ASU no dia 9 de novembro. Foram realizadas 6 reuniões.  Conversamos com 14 pessoas, todas com funções relevantes na ASU (Vice-Presidente, Vice Provost, Diretor de inovação, Gestor de empreendedorismo…). Visitar a ASU representou uma boa oportunidade para conhecermos uma experiência que demonstra que é possível repensarmos as nossas instituições. Escrevemos um relato da nossa visita, para compartilhar o aprendizado e instigar a reflexão.  

Os autores do livro criticam o “lado negro da tradição”, a “racionalizada burocrática”, a “gaiola de ferro”, o “isomorfismo” das IES e defendem instituições capazes de responder às novas dinâmicas da sociedade, especialmente, no que se refere ao acesso, à retenção, ao aprendizado, ao empreendedorismo e à incidência acadêmica. No Brasil, de modo geral, estamos mais acostumados com a “manutenção do mais do mesmo”. Há o perigo de acreditarmos que “fazemos as coisas certas”, portanto, não precisamos realizar mudanças. Como podemos conseguir resultados diferentes se estamos fazendo as mesmas coisas?

Michael Crow e sua equipe são pessoas incomodadas com “a tradição, com a burocracia, com o isomorfismo” e estão e focadas no processo de construção da nova universidade americana. Não precisamos copiar a ASU, os conceitos de Crow ou de qualquer outra universidade ou presidente de instituições de ensino dos Estados Unidos.  Temos de trocar experiências, investir no aprendizado institucional e pessoal, adaptar, “tropicalizar”, criar algo condizente com a realidade institucional e manter a cooperação. O que não podemos é desconhecer as melhores práticas de educação superior e ficarmos isolados em um mundo cada vez mais articulado em rede.

A ASU tem oito aspirações que foram desenhadas para tornar o planejamento institucional uma realidade: a) contribuir com o desenvolvimento do lugar em que estão inseridos; b) realizar transformações sociais conectadas com as demandas, c) valorizar o empreendedorismo, para encorajar a inovação; d) realizar pesquisa que tenha alto impacto e aplicabilidade prática; e) focar no sucesso do estudante; f) integrar as disciplinas em processos interdisciplinares; g) ser socialmente comprometida; h) ter engajamento global.

As aspirações da ASU não são meros desejos que estão em seus documentos. Em todas as conversas foi possível perceber a convergência das aspirações. Os gestores com quem conversamos ao longo do dia descrevem uma situação de consolidação das mudanças e de realização dos princípios declarados. A ASU começou a implementar as mudanças em 2003. Nos últimos cinco anos, as mudanças se consolidaram, ou seja, mudanças culturais não ocorrem de um ano para outro. No Brasil, é comum sermos imediatistas, não apostarmos em processos de longo prazo e não implementarmos o que planejamos.

Obviamente, a ASU tem um perfil muito claro do líder desejado. Os gestores da instituição declararam que ao longo dos anos foi necessário trocar líderes que não se adaptaram às mudanças culturais. O estilo empreendedor, que deseje a inovação, focado nas metas do planejamento e nos resultados e que enfrente as adversidades parece ser o estilo de líder ideal. Da mesma forma, a ASU demitiu aproximadamente 100 professores que não se adequaram ao modelo acadêmico. Ocorreram algumas mudanças top-down; outras, negociadas.

A ASU é um bom exemplo de instituição que desenhou um estilo de liderança universitária. Há sintonia entre os líderes, no estilo e no foco. Não há esquizofrenias institucionais, em que os diversos setores funcionam de forma desconexa. Há clareza no ecossistema institucional, o que é algo raro.             

Uma das marcas da ASU é o desejo declarado de ser uma instituição mensurada e avaliada não pela quantidade de alunos que exclui, mas pela quantidade de alunos que consegue incluir, criticando claramente as universidades americanas de elite, e pelo sucesso de seus estudantes. A instituição tem foco no engajamento dos estudantes, na aprendizagem ativa e significativa e na pesquisa que tenha valor econômico, social e cultural para a sociedade. Como disseram os gestores com os quais conversamos, deve haver impacto local e aplicação global. Há um contínuo olhar para estudantes com deficiência de aprendizagem.

Em todas as conversas, o tema do engajamento esteve presente de forma estratégica, o que é uma diferença significativa, quando pensamos no foco dos gestores das IES brasileiras. Na ASU, engajam-se os estudantes em espaços físicos que permitem a cooperação, em uma série de atividades esportivas, sociais e voluntárias que favorecem a convivência social, em ambientes makers, onde os alunos podem desenvolver seus projetos sob a orientação de monitores e professores, em um currículo mais personalizado e flexível, em atividades extracurriculares, etc. A preocupação com o “nivelamento” não está em “cursinhos pré-aulas” ou em atividades fragmentadas e sem elo com os cursos de  graduação dos estudantes.

O engajamento é o resultado de uma série de ações concretas, como por exemplo, o ambiente de aprendizagem, entendido não apenas como o espaço físico. A ASU acompanha, via plataformas tecnológicas, o processo de aprendizagem dos estudantes. A universidade consegue escalar a personalização do ensino com baixo custo e alta performance, utilizando plataformas adaptativas de aprendizagem. Além disso, adota um modelo híbrido, mesclando atividades online com momentos presenciais, em que aplicam metodologias ativas de aprendizagem, como o PBL, por exemplo.  Desta forma, eles invertem a sala de aula de uma forma muito inteligente. O resultado é menor índice de reprovações e de evasão, maior engajamento dos estudantes e menor custo operacional.

Os currículos são flexíveis, portanto, o estudante constrói o seu percurso, de uma forma mais individualizada. A cultura da interdisciplinaridade está estabelecida. As pesquisas e os cursos de graduação estão organizados para favorecer as ações interdisciplinares. Os alunos são estimulados a desenvolverem projetos em grupos de cursos diferentes. A avaliação é entendida como um processo.      

          A ASU possui uma área de empreendedorismo e inovação vinculado ao staff da presidência. O empreendedorismo não é algo isolado, que se manifesta em uma disciplina ou em um projeto de curso. É algo que está inserido no ecossistema da instituição (ecossistema empreendedor), portanto, em todos os cursos de graduação, de forma transversal. A área desenvolve diversas iniciativas, com foco na criação da cultura do empreendedorismo, no fortalecimento das habilidades básicas (pró-atividade, capacidade de trabalho em grupos diversos, etc.), no atendimento as demandas da sociedade e na criação de serviços e empresas que gerem valor econômico e social.    

Provavelmente, a ASU será uma das instituições dos Estados Unidos com a melhor plataforma de ensino a distância. Há planos para a instituição ter 40 mil estudantes online. Os gestores da área de EAD estão focados em buscar as melhores soluções tecnológicas.

A visita na ASU contribuiu de forma significativa para ampliarmos o nosso conhecimento sobre as possibilidades de inovação acadêmica. Poucas IES que conhecemos possuem um time de líderes que trabalham de forma sintonizada, a partir de um planejamento que tem como desejo fundar na ASU um novo paradigma de universidade. As aspirações da New American University estão presentes em todos os ambientes da instituição. No início da nossa visita, acreditamos que as aspirações eram apenas sonhos. Ao longo do dia, fomos percebendo a sintonia das argumentações e as experiências concretas. Aprendemos uma boa lição: é possível realizarmos mudanças significativas nas nossas instituições, via inovação acadêmica, sem necessariamente aumentarmos os custos. Inovação, no caso da ASU, exigiu vontade política, líderes bem formados, corajosos e empreendedores, capacidade de compreender as melhores práticas da educação superior, redesenho do perfil e investimento no corpo docente, engajamento dos estudantes  e um planejamento de longo prazo.